domingo, 25 de agosto de 2013

Síria e o agravamento da guerra civil.

Desde o início dos protestos sociais em março de 2011, a Síria atravessa um momento de grave tensão social. A maioria da população corresponde aos sunitas, divisão do islamismo que abrange cerca de 90% dos islâmicos do mundo. O presidente sírio Bashar al-Assad pertence à seita islâmica alauita, uma vertente dos xiitas. Os alauitas podem ser considerados como a elite econômica e política da Síria, possuindo também uma posição privilegiada nas forças armadas. O governo sírio é apoiado pelo Irã, país de maioria xiita e que é declaradamente opositor à dominação geopolítica do ocidente na região. Recebe também grande influência do grupo xiita Hezbolah, milícia islâmica que luta pela criação de um Estado palestino e que recentemente assumiu o poder no vizinho Líbano.
Bashar al-Assad chegou à presidência no ano de 2000 após o falecimento de seu pai, Hafez al-Assad, prometendo uma série de reformas que nunca foram realizadas. O partido Ba’ath governa a Síria desde 1963 e pouco tempo depois que chegou ao poder impôs censura à imprensa e decretou um Estado de Emergência, que é quando o governo pode tomar medidas que contrariam os direitos civis em nome dos ideais do Estado, efetuando prisões, impondo toques de recolher, entre outras medidas.
Atualmente o país é governado por uma espécie de cartel formado por governistas e empresários. Algumas reformas políticas foram realizadas nos últimos anos, mas não foram suficientes para impedir as manifestações da população civil que começaram na cidade de Deraa, ao sul, e que se espalharam por todo o país. A violência aumentou muito, e os dados da ONU indicam ao menos 10.000 mortes em 1 ano de conflito.
Ao final do mês de abril de 2011, o governo encerrou o Estado de Emergência que vigorou no país por 38 anos, afirmando que as manifestações políticas pacíficas seriam permitidas no país. Após a projeção internacional da crise, o líder sírio tentou convencer a ONU que as ações contra os manifestantes não eram intensas, diferente das informações que os rebeldes e os opositores em exílio expuseram para a comunidade internacional. ONU e Liga Árabe procuraram saídas diplomáticas e negociaram um cessar-fogo que aparentemente não foi praticado. Os bombardeios contra os focos de resistência rebelde ainda são constantes.
As deserções de soldados sírios começaram a ajudar os opositores, que pretendem criar um conselho transitório de governo. Os principais alvos dos rebeldes são os símbolos do poder do governo, como delegacias e tribunais. As cidades de Aleppo (a mais populosa e importante) e a capital Damasco concentram a maior parte dos confrontos. O número de refugiados já ultrapassa a marca de 250 000 indivíduos, a sua maioria em direção à Jordânia.

Os Estados Unidos parecem não querer interferir diretamente na questão Síria por entenderem o momento inoportuno para encarar o Irã, que pode se sentir ameaçado ao ver o ocidente interferindo nas políticas internas do seu aliado. Além disso, a característica apresentada pelo governo norte-americano de Barack Obama é evitar “novos Iraques”, isto é, guerras dispendiosas do ponto de vista financeiro e humano. Há uma disposição por parte da ONU de tomar medidas mais drásticas contra Bashar al-Assad, que são veementemente refutadas por China e Rússia, países que possuem em seus territórios conflitos separatistas e etnias que buscam autonomia. Várias sanções políticas e econômicas já foram impostas, como o congelamento dos bens do Estado sírio e a suspensão da comercialização do petróleo, principal produto exportado pelo país. A saída de al-Assad é algo inevitável, mas pode ceifar milhares de vidas até a sua consumação.
O esquema atual do conflito na Síria pressagia uma nova intervenção ocidental. O deslocamento de navios norte-americanos e a posição da França antecipam uma participação talvez mais direta do que aquela que se conhece até hoje, ou seja, o fornecimento de armamentos aos rebeldes e treinamento militar. Resta saber a posição que adotará a Rússia frente às sirenes cada vez mais próximas de uma nova cruzada ocidental.
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sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Cidades costeiras correm risco de perder US$ 1 trilhão com enchentes.

As 136 maiores cidades costeiras do mundo correm um risco de sofrer perdas anuais combinadas de US$ 1 trilhão (cerca de R$ 2,393 trilhões) com enchentes até 2050 a menos que melhorem drasticamente suas defesas, alertou um estudo.
As perdas atuais são de US$ 6 bilhões ao ano (mais de R$ 14 bilhões), e quatro cidades - Miami, Nova York e Nova Orleans, nos Estados Unidos, e Guangzhou, na China - respondem por 43% dos custos, destacou a pesquisa publicada na revista Nature Climate Change.
O economista Stephane Hallegatte, do Banco Mundial, e seus colegas criaram cenários de risco de perdas com base no crescimento populacional das cidades, em diferentes níveis de elevação dos oceanos, em modernizações dos sistemas de proteção e na subsidência, ou seja, o afundamento de áreas superficiais frequentemente vinculada à extração de petróleo ou outros recursos.
Assumindo que as cidades vão melhorar sua proteção para manter o risco de inundações nos níveis atuais e baseados puramente no crescimento projetado das populações das cidades e nos bens acumulados localmente, a equipe alertou para um crescimento nove vezes maior em perdas até US$ 52 bilhões ao ano (aproximadamente R$ 124 bilhões anuais) até 2050.
Quando a equipe acrescentou os efeitos da subsidência e da elevação do nível do mar induzida pelo clima, a cifra cresce entre US$ 60 e US$ 63 bilhões ao ano (entre R$ 143 bilhões e R$ 150 bilhões).
"Sem adaptações [de proteção contra enchentes], o aumento projetado de perdas médias até 2050 é enorme, com perdas agregadas aumentando para mais de US$ 1 trilhão por ano", segundo o pior cenário projetado, destacou.
No entanto, até mesmo a melhor proteção adotada no mundo não eliminaria os riscos, advertiu o estudo. Embora diques mais elevados sejam capazes de reduzir as inundações, a magnitude das perdas registradas quando elas ocorrem continuará a crescer.
"Temos cada vez mais pessoas dependentes destas proteções. Isto significa que se tivermos o rompimento de um dique, havendo mais pessoas atrás dele, teremos catástrofes maiores", explicou Hallegatte à AFP.
Com a melhora da proteção, as cidades com as maiores perdas anuais projetadas até 2050 seriam a chinesa Guangzhou, com US$ 13,2 bilhões (R$ 31 bilhões); as indianas Mumbai, com US$ 6,4 bilhões (R$ 15,5 bilhões), e Calcutá, com US$ 3,4 bilhões (R$ 8,3 bilhões); a equatoriana Guayaquil, com US$ 3,2 bilhões (R$ 7,1 bilhões); e Shenzhen, também na China, com US$ 3,1 bilhões (R$ 7,5 bilhões).
A sexta da lista seria a norte-americana Miami, com perdas anuais projetadas de US$ 2,5 bilhões (R$ 5,9 bilhões); seguida de Tianjin, na China, com US$ 2,3 bilhões (R$ 5,5 bilhões); Nova York, com US$ 2 bilhões (R$ 4,8 bilhões), nos Estados Unidos; Cidade Ho Chi Minh, no Vietnã, com US$ 1,9 bilhão (R$ 4,55 bilhões); e Nova Orleans, com US$ 1,9 bilhão (R$ 4,55 bilhões).
De acordo com Hallegatte, sua equipe estima que seriam necessários cerca de US$ 50 bilhões ao ano (quase R$ 120 bilhões anuais) para intensificar a proteção contra enchentes nas 136 cidades mencionadas no estudo, um cifra "muito abaixo" das perdas estimadas.

"Fracassar na adaptação não é uma opção viável para as cidades costeiras", ressaltou o estudo.
Miami área sedimentar
Centro de Veneza durante a maré alta. 

domingo, 18 de agosto de 2013

Mudança climática: 2020 será muito tarde. (ALERTA)

Agência Internacional de Energia (AIE) publicou um relatório especial sobre o futuro do clima e as negociações internacionais com uma advertência aos governos: o ano de 2020 será demasiado tarde para tomar decisões . Na avaliação da agência, algumas medidas devem ser adotadas antes dessa data, caso se queira “manter vivo o objetivo de 2ºC” e o setor de energia deve reduzir suas emissões a partir de agora a uma taxa de 5%/ano.
Evitar a mudança climática perigosa implica manter um nível de concentração de gases de efeito estufa abaixo das 450 ppm que assegure um aumento da temperatura média do planeta não acima dos 2ºC. Essa é a meta traçada pela Convenção da Mudança Climática, realizada em 2009.
A última rodada de negociações da Convenção da Mudança Climática (Doha, dezembro de 2012) estabeleceu um novo roteiro (Doha Climate Gateway), definindo o anos de 2015 como data limite para alcançar uma série de acordos que entrarão em vigor em 2020. O relatório da AIE alerta, porém, que essa é uma data demasiado longínqua para assegurar a manutenção da estabilidade climática em virtude das emissões que terão sido acumuladas até lá.
O setor de energia é responsável por cerca de 80% das emissões globais e se espera que, para o ano de 2020, estas alcancem um nível de 4 gigatoneladas de dióxido de carbono equivalente (GtCO2e) , acima da trajetória consistente com o objetivo dos 2ºC. Para atingir essa meta é necessário que as emissões alcancem seu pico em 2020 e logo comecem a cair vigorosamente. Com as emissões crescendo constantemente e um acordo que recém começará a ser implementado nesta data, isso resultará impossível, diz a agência.

As medidas
Em função disso, a AIE propõe quatro medidas urgentes a serem aplicadas com o objetivo de “comprar um tempo precioso enquanto as negociações continuam”. A primeira delas é a adoção de medidas específicas de eficiência energética, o que poderia garantir a metade das reduções necessárias. Uma segunda proposta é limitar a construção e uso das usinas termoelétricas movidas a carvão (21% das reduções). A terceira medida é minimizar a fuga de metano proveniente das atividades de exploração de gás e de petróleo (18% das reduções). E, finalmente, acelerar o desmantelamento dos subsídios ao consumo de combustíveis fósseis que, em 2010, alcançaram 523 bilhões de dólares.
O documento lembra que para ter 50% de possibilidades de não ultrapassar o objetivo dos 2ºC, o total de emissões possível até a primeira metade deste século é de 1440 GtCO2e. Deste “orçamento de carbono”, 420 GT já foram emitidas entre 2000 e 2011 e outras 136 Gt serão emitidas de setores não energéticos (agricultura, desmatamento, etc) até 2050. Isso deixa um máximo possível de emissões de 884 Gt do setor energético para essa data, para o que é necessária uma redução das emissões do setor a uma taxa anual de 5%.

O gás natural em debate
O gás natural apareceu nos últimos anos como um substituto menos contaminante do que o carvão, o que levou a um desenvolvimento importante de sua exploração, particularmente no chamado gás “não convencional” (“shale” e “tight” gás).
O gás natural é defendido por apresentar menores emissões de carbono por unidade de energia consumida. No entanto, essa mesma condição faz com que, em termos absolutos, as emissões aumentem (uma espécie de “paradoxo de Jevons” climático) (1). Em 2012, as emissões globais de CO2 do setor energético aumentaram em 400 Mt em relação ao ano de 2011 (1,4%). Este aumento responde ao incremento do uso de gás natural (2,7%), petróleo (1,1%) e carvão (0,6%). Quando analisamos a responsabilidade de cada um destes fósseis no aumento global de emissões energéticas vemos que 44% corresponde ao gás natural, 44% ao carvão e 12% ao petróleo.
As termoelétricas de ciclo combinado a gás produzem a metade das emissões por kWh do que aquelas à base de carvão. Mas parte desse ganho se perde pelas emissões furtivas de metano derivadas da produção e distribuição de gás natural. Só um terço das reduções necessárias pode ser obtido pela troca de carvão por gás no setor elétrico, o que está indicando que a mudança de combustível não é a opção mais apropriada.
O sentido da urgência
Estas medidas que a AIE propõe são as que ela considera economicamente viáveis no contexto atual. Não significam nenhuma ameaça para o crescimento econômico nem podem conduzir a uma recessão planetária. Não são medidas de fundo, são paliativos. Mas, para além do caráter apropriado ou não dessas propostas, o que deve chamar a atenção é sua mensagem central: não se pode esperar pelas negociações da Convenção de Mudança Climática. Elas chegarão muito tarde.
Os governos de cada país do mundo mas sobretudo aqueles que possuem matrizes energéticas mais poluidoras, deveria levar um pouco a sério a advertência e não adiar decisões à espera de 2020. Quando chegarmos lá, as medidas a tomar talvez sejam muito mais caras e talvez a mudança climática já seja uma realidade irreversível.
NOTA
(1) Em 1865, o economista britânico William Jevons descreveu em seu livro “O Problema do Carvão” aquilo a que mais tarde veio chamar-se de “Paradoxo de Jevons“. Ao observar que as recém-introduzidas máquinas a vapor desenvolvidas por James Watt, muito mais eficientes em termos de produtividade que as antecessoras, fizeram ainda assim aumentar a quantidade total de carvão consumido no país, Jevons escreveu: “É um completo engano supor que um uso mais eficiente dos combustíveis implicará numa redução do seu consumo. A verdade é precisamente o oposto” (O Problema do Carvão, 1866, p 123). Fonte: http://ecohabitararquitetura.com.br/blog/tag/paradoxo-de-jevons/