Fonte: BBC Brasil.
O
Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) divulga na
sexta-feira em Estocolmo, na Suécia, um novo relatório no qual pretende
estabelecer, com o maior grau de certeza já obtido, o papel das atividades
humanas nas mudanças climáticas.
Para
ajudar a entender melhor o tema, a BBC preparou uma listou algumas perguntas e
respostas sobre a questão:
O
que é mudança climática?
O
clima do planeta está mudando constantemente ao longo do tempo geológico. A
temperatura média global hoje é de cerca de 15ºC, mas as evidências geológicas
sugerem que ela já foi muito maior ou muito menor em outras épocas no passado.
Entretanto,
o atual período de aquecimento está ocorrendo de maneira mais rápida do que em
muitas ocasiões no passado. Os cientistas estão preocupados de que a flutuação
natural, ou variabilidade, está dando lugar a um aquecimento rápido induzido
pela ação humana, com sérias consequências para a estabilidade do clima no
planeta.
O que é 'efeito estufa'?
O
efeito estufa se refere à maneira como a atmosfera da Terra "prende"
parte da energia do Sol. A energia solar irradiada de volta da superfície da
Terra para o espaço é absorvida por gases atmosféricos e reemitida em todas as
direções.
A
energia que irradia de volta para o planeta aquece tanto a baixa atmosfera
quanto a superfície da Terra. Sem esse efeito, a Terra seria 30ºC mais fria,
deixando as condições no planeta hostis para a vida.
Os
cientistas acreditam que estamos contribuindo para o efeito natural de estufa
com gases emitidos pela indústria e pela agricultura, absorvendo mais energia e
aumentando a temperatura.
O
mais importante desses gases no efeito estufa natural é o vapor de água, mas
suas concentrações mostram pouca mudança. Outros gases do efeito estufa incluem
dióxido de carbono, metano e óxido nitroso, que são liberados pela queima de
combustíveis fósseis. O desmatamento contribui para seu aumento ao eliminar
florestas que absorvem carbono.
Desde
o início da revolução industrial, em 1750, os níveis de dióxido de carbono
(CO2) aumentaram mais de 30%, e os níveis de metano cresceram mais de 140%. A
concentração de CO2 na atmosfera é agora maior do que em qualquer momento nos
últimos 800 mil anos.
Qual é a evidência sobre o aquecimento?
Os
registros de temperatura, a partir do fim do século 19, mostram que a
temperatura média da superfície da Terra aumentou cerca de 0,8ºC nos últimos
cem anos. Cerca de 0,6ºC desse aquecimento ocorreu nas últimas três décadas.
Dados
de satélites mostram um aumento médio nos níveis do mar de cerca de 3
milímetros por ano nas últimas décadas. Uma grande proporção da mudança nos
níveis do mar se deve à expansão dos oceanos pelo aquecimento. Mas o
derretimento das geleiras de montanhas e das camadas de gelo polar também
contribuem para isso.
A
maioria das geleiras nas regiões temperadas do mundo e na Península Antártica
estão encolhendo. Desde 1979, registros de satélites mostram um declínio
dramático na extensão do gelo no Ártico, a uma taxa anual de 4% por década. Em
2012, a extensão de gelo alcançou o menor nível já registrado, cerca de 50%
menor do que a média do período entre 1979 e 2000.
O
manto de gelo da Groenlândia verificou um derretimento recorde nos últimos
anos. Se a camada inteira, de 2,8 milhões de quilômetros cúbicos, derretesse,
haveria um aumento de 6 metros nos níveis dos mares.
Dados
de satélites mostram que a capa de gelo do oeste da Antártica também está
perdendo massa, e um estudo recente indicou que o leste da Antártica, que não
havia mostrado tendências claras de aquecimento ou resfriamento, também pode
ter começado a perder massa nos últimos anos. Mas os cientistas não esperam
mudanças dramáticas. Em alguns lugares, a massa de gelo pode aumentar, na
verdade, com as temperaturas em alta provocando mais tempestades de neve.
Os
efeitos de uma mudança climática também podem ser vistos na vegetação e nos
animais terrestres. Isso inclui também o florescimento e frutificação precoces
em plantas e mudanças nas áreas ocupadas pelos animais terrestres.
Há
uma pausa no aquecimento?
Alguns
especialistas argumentam que desde 1998 não houve um aquecimento global
significativo, apesar do aumento contínuo nos níveis de emissão de CO2. Os
cientistas tentam explicar isso de várias formas.
Isso
inclui: variações na emissão de energia pelo Sol, um declínio no vapor de água
atmosférico e uma maior absorção de calor pelos oceanos. Mas até agora, não há
um consenso geral sobre o mecanismo preciso por trás dessa pausa.
Céticos
destacam essa pausa como um exemplo da falibilidade das previsões baseadas em
modelos climáticos computadorizados. Por outro lado, os cientistas do clima
observam que o hiato no aquecimento ocorre em apenas um dos componentes do
sistema climático - a média global da temperatura da superfície -, e que outros
indicadores, como o derretimento do gelo e as mudanças na fauna e na flora
demonstram que a Terra continua a se aquecer.
Quanto
as temperaturas vão aumentar no futuro?
Em
seu relatório de 2007, o IPCC previu um aumento da temperatura global entre
1,8ºC e 4ºC até 2100.
Mesmo
que as emissões de gases do efeito estufa caiam dramaticamente, os cientistas
dizem que os efeitos continuarão, porque partes do sistema climático,
particularmente os grandes corpos de água e gelo, podem levar centenas de anos
para responder a mudanças na temperatura. Também leva décadas para que os gases
do efeito estufa sejam removidos da atmosfera.
Quais serão os impactos disso?
A
escala do impacto potencial é incerto. As mudanças podem levar à escassez de
água potável, trazer mudanças grandes nas condições para a produção de
alimentos e aumentar o número de mortes por inundações, tempestades, ondas de
calor e secas.
Os
cientistas preveem mais chuvas em geral, mas dizem que o risco de seca em áreas
não costeiras deverá aumentar durante os verões mais quentes. Mais inundações
são esperadas por causa de tempestades e do aumento do nível do mar. Deverá
haver, porém, muitas variações regionais nesse padrão.
Os
países mais pobres, que estão menos capacitados para lidar com a mudança
rápida, deverão sofrer mais.
A
extinção de plantas e animais está prevista, por conta de mudanças nos habitats
mais rápidas do que a capacidade de adaptação das espécies à estas. A
Organização Mundial da Saúde (OMS) advertiu que a saúde de milhões de pessoas
pode ser ameaçada por aumentos nos casos de malária, doenças transmitidas pela
água e malnutrição.
O
aumento na absorção de CO2 pelos oceanos pode levá-los a se tornar mais ácidos.
Esse processo de acidificação em andamento poderia provocar grandes problemas
para os recifes de corais, já que as mudanças químicas impedem os corais de
formar um esqueleto calcificado, que é essencial para sua sobrevivência.
O
que não sabemos?
Os
modelos computadorizados são usados para estudar a dinâmica do clima na Terra e
fazer projeções sobre futuras mudanças de temperatura. Mas esses modelos
climáticos diferem sobre a "sensibilidade climática" - a quantidade
de aquecimento ou esfriamento que ocorre por conta de um fator específico, como
a elevação ou a queda na concentração de CO2.
Os
modelos também diferem na forma como expressam "feedback climático".
O
aquecimento global deverá provocar algumas mudanças com probabilidade de criar
mais aquecimento, como a emissão de grandes quantidades de gases do efeito
estufa com o derretimento do permafrost (gelo eterno da superfície da Terra).
Isso é conhecido como feedback climático positivo (no sentido de adicionar
calor).
Mas
também existem os feedbacks negativos, que compensam o aquecimento. Por
exemplo, os oceanos e a terra absorvem CO2 como parte do ciclo do carbono.
A
questão é saber qual o resultado final da soma dessas variáveis.
As
inundações vão me atingir?
Detalhes
vazados do relatório a ser apresentado nesta semana indicam que no pior cenário
traçado pelo IPCC, com o maior nível de emissões de dióxido de carbono, os
níveis dos mares no ano 2100 poderiam subir até 97 centímetros.
Alguns
cientistas criticam os modelos usados pelo IPCC para calcular esse aumento.
Usando o que é chamado de modelo semiempírico, as projeções para o aumento do
nível do mar podem chegar a 2 metros. Nessas condições, 187 milhões de pessoas
a mais no mundo sofreriam com inundações.
Mas
o IPCC deve dizer que não há consenso sobre o enfoque semiempírico e manterá o
dado pouco inferior a 1 metro.
O que vai acontecer com os ursos polares?
O
estado dos polos Norte e Sul tem sido uma preocupação crescente para a ciência,
conforme os efeitos do aquecimento global se tornam mais intensos nessas
regiões.
Em
2007, o IPCC disse que as temperaturas no Ártico aumentaram quase duas vezes
mais que a média global nos últimos cem anos. O relatório destacou que a região
pode ter uma grande variação, com um período quente observado entre 1925 e
1945.
Nos
rascunhos do relatório desta semana, os cientistas dizem que há uma evidência
maior de que as camadas de gelo e as geleiras estão perdendo massa e que a
camada de gelo está diminuindo no Ártico.
Em
relação à Groenlândia, que por si só tem a capacidade de aumentar os níveis
globais dos mares em 6 metros, o painel diz estar 90% certo de que a velocidade
da perda de gelo entre 1992 e 2001 aumentou seis vezes no período entre 2002 e
2011.
Enquanto
a extensão média do gelo no Ártico caiu cerca de 4% por década desde 1979, o
gelo na Antártica aumentou até 1,8% por década no mesmo período.
Para
o futuro, as previsões são bastante dramáticas. No pior cenário traçado pelo
IPCC, um Ártico sem gelo no verão é provável até o meio deste século.
E
a perspectiva para os ursos polares e para outras espécies que vivem nesse
ambiente não é bom, segundo disse à BBC o professor Shang-Ping Xie, do
Instituto de Oceanografia da Universidade da Califórnia em San Diego.
"Haverá
bolsões de gelo marítimo em alguns mares marginais. Esperamos que os ursos
polares sejam capazes de sobreviver no verão nesses bolsões de gelo
remanescentes", disse.
Qual
a credibilidade do IPCC?
IPCC
reconheceu erro em inclusão de previsão sobre fim das geleiras do Himalaia até
2035. A escala global do envolvimento científico com o IPCC dá uma ideia do
peso dado ao painel.
Dividido
em três grupos de trabalho que analisam a ciência física, os impactos e as
opções para limitar as mudanças climáticas, o painel envolve milhares de
cientistas de todo o mundo.
O
relatório a ser apresentado em Estocolmo tem 209 autores coordenadores e 50
revisões de editores de 39 países diferentes.
O
documento é baseado em cerca de 9.000 estudos científicos e 50 mil comentários
de especialistas. Mas em meio a esse conjunto enorme de dados, as coisas podem
não sair como o esperado.
No
último relatório, publicado em 2007, houve um punhado de erros que ganharam
grande projeção, entre eles a afirmação de que as geleiras do Himalaia
desapareceriam até 2035. Também houve erro na projeção da porcentagem do
território da Holanda que ficaria sob o nível do mar.
O
IPCC admitiu os erros e explicou que em um relatório de 3 mil páginas é sempre
possível que haja alguns pequenos erros. A afirmação sobre o Himalaia veio da
inclusão de uma entrevista que havia sido publicada pela revista New
Scientist.
Em
2009, uma revisão da forma como o IPCC analisa as informações sugeriu que o
painel seja mais claro no futuro sobre as fontes de informação usadas.
O
painel também teve a reputação manchada pela associação com o escândalo
provocado pelo vazamento de e-mails trocados entre cientistas que trabalhavam
para o IPCC, em 2009.
As
mensagens pareciam mostrar algum grau de conluio entre os pesquisadores para
fazer com que os dados climáticos se encaixassem mais claramente na teoria das
mudanças climáticas induzidas pelo homem.
Porém
ao menos três pesquisas não encontraram evidências para apoiar essa conclusão.
Mas
o efeito final desses eventos sobre o painel foi o de torná-lo mais cauteloso.
Apesar
de o novo relatório possivelmente enfatizar uma certeza maior entre os
cientistas de que as atividades humanas estão provocando o aquecimento
climático, em termos de escala, níveis e impactos a palavra
"incerteza" deverá aparecer com bastante frequência.
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