Bruno Marinoni - Observatório do
Direito à Comunicação
Um cineasta procura patrocínio e
editais que possam financiar o seu filme de terror. O elenco é negro e parte da
história se refere à escravidão colonial. Resultado: recusas e mais recusas.
Ele decide arriscar algumas alterações e mantém o mesmo roteiro com personagens
brancos no sul do país. Resultado: vence o primeiro edital. Para o premiado
diretor de cinema Joel Zito não há coincidência nessa história vivenciada por
um colega. “Existe uma censura branca para filmes com temática racial e que
abordem a questão do racismo no Brasil”, afirma.
Filho de pai motorista e de mãe
empregada doméstica e operária, Zito, doutor em Ciências da Comunicação pela
Universidade de São Paulo (USP), vê a persistência da ideologia do
branqueamento no Brasil, mesmo que hoje esse discurso que um dia já foi
explícito tenha se tornado implícito. “O principal mecanismo pelo qual funciona
essa ideologia no cinema é a associação do branco e do belo, em que o negro e o
indígena são associados ao feio, ao crime, ao “outro””.
De acordo com o cineasta, não se
dá o devido destaque aos negros que participam na sociedade com consciência
aguda da questão do racismo. Assim, quando aparece um negro protagonista na TV,
seja numa ficção ou em uma situação cotidiana, o telespectador acostumado com a
invisibilidade e subalternidade dessa representação se pergunta “de onde foi
que ele surgiu?”, destaca Zito.
Para o diretor da Casa de Criação
Cinema seriam dois os principais mecanismos de censura para negros que
pretendem fazer cinema no país. O primeiro diz respeito a origem de classe da
população negra. “Fazer cinema é muito caro e levantar recursos depende da rede
de relacionamentos. Quase todo realizador negro vem da classe C e D. Mesmo os
prêmios recebidos contam pouco nessa hora”, declara. Dessa forma, as camadas
brancas da sociedade, localizadas nas classes A e B teriam acesso privilegiado
aos fundos que financiam o cinema, pois já nascem dentro da rede que outros
setores precisam buscar se inserir e, no caso específico de indivíduos negros e
indígenas, enfrentar o preconceito racista.
O segundo caso é mais explícito e
diz respeito à predisposição dos patrocinadores em financiar filmes com
temáticas raciais e que abordem o racismo. Zito afirma já ter ouvido de uma
empresa uma resposta do tipo “não quero ver meu produto associado a isso”. O
cineasta defende que para contrabalançar essa situação é preciso definir
políticas afirmativas para produtos audiovisuais com temática e elenco composto
por grupos étnicos invisibilizados nos meios de comunicação.
Mesmo vendo um lado positivo em
experiências recentes da produção audiovisual brasileira, em que há roteiro,
elenco e direção que dão conta de um universo em que a população negra se torna
protagonista, o diretor Joel Zito diz sentir certo incômodo com a persistência
de uma imagem naturalizada do negro subalterno. “Temos muitos exemplos de
lideranças e personagens contemporâneos que poderiam quebrar essa visão
preconceituosa”, defende.
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