O
IPCC da ONU sobre Mudanças Climáticas, reafirma a constatação de que a
influência humana é decisiva para as transformações em curso no sistema
climático global, aumentando esta certeza para 95%. A grande novidade do
documento, elaborado por 259 cientistas de 39 países, com base em cerca de nove
mil estudos climáticos, é seu método de apresentação que, desta vez, optou pela
regionalização das previsões e pela projeção de cenários distintos que sugerem
os limites possíveis para as emissões de gases de efeito estufa. O objetivo da
mudança é tornar mais próximas das pessoas as previsões, muitas vezes encaradas
como genéricas e distantes da realidade local, e aumentar o engajamento social
nas discussões e ações de combate às mudanças climáticas.
“Embora
estes públicos possam não estar interessados em discussões científicas globais,
eles podem se interessar pelas ameaças iminentes que as mudanças climáticas
representam para sua própria segurança e para a segurança de seus lares,
famílias e propriedades. Em uma época na qual muitos consideram as mudanças
climáticas apenas como uma ameaça futura, a intenção deste sumário regional é
torná-las reais, relevantes e urgentes”, diz o relatório, divulgado em 27 de
setembro na cidade de Estocolmo, na Suécia. Os estudos elaborados pelo segundo
GT e pelo terceiro GT do IPCC serão publicados em março e em outubro de 2014,
respectivamente.
Em
seu esforço para estabelecer limites às emissões e tornar mais tangíveis os
números que envolvem as mudanças climáticas, o IPCC traçou quatro modelos de
previsão para todo o planeta, denominados Representative Concentration
Pathways, com caminhos possíveis, sempre associados à ação humana, para a
concentração de gases de efeito estufa no planeta. Na previsão mais otimista, que
fala na emissão de 270 bilhões de toneladas de carbono, a Terra sofrerá até
2100 um aumento de 0,3 a 1,7 grau Celsius em relação à média da temperatura
terrestre observada entre 1986 e 2005.
Na
previsão mais pessimista, o aumento da temperatura será de 2,6 a 4,8 graus
Celsius, com a emissão de 1,69 trilhões de toneladas de carbono. Na prática,
isso significará, entre outras coisas, o desaparecimento completo do gelo no
Ártico durante o verão e o derretimento das grandes geleiras, das calotas
polares e da Groenlândia. A consequência mais sentida desse derretimento,
segundo o IPCC, será a elevação dos oceanos, que poderá ser de 26 cm a 55 cm no
cenário mais otimista ou de 45 cm a 82 cm no cenário mais pessimista.
Para
a brasileira Suzana Khan, que é vice-presidente do IPCC, o Quinto Relatório
coloca também no debate sobre mudanças climáticas questões relativas a aspectos
socioeconômicos e demográficos: “Não é simplesmente uma questão da física ou
química da atmosfera, nem tampouco simplesmente de se fazer os cálculos de
quanto se está emitindo e quanto a atmosfera e o oceano sofrem. Tudo isso tem
uma relação muito forte com a maneira que nós consumimos, com a maneira que nós
pretendemos nos desenvolver. Então, quando você trabalha com diversos cenários
possíveis, todos esses aspectos passam a ser também considerados. Não só como o
clima vai reagir, mas como a sociedade de uma maneira geral vai reagir a
mudanças de padrão de consumo, de cultura, à aceitação de novas tecnologias.
Esses cenários representativos que o IPCC tem trabalhado incorporam todos esses
aspectos que não são tão técnicos, mas algo muito mais comportamental da
própria sociedade”, diz.
Brasil
No
caso específico do Brasil, o relatório do IPCC indica um provável aumento médio
de até 5 graus Celsius na temperatura – com aumento de até 7 graus nas máximas
diárias – e redução de até 30% no volume médio de chuvas do país até 2100. O
relatório traz também menção especial à formação de “ilhas de calor nas zonas
urbanas”, sobretudo na Região Sudeste do Brasil, onde as principais metrópoles
conviverão até o fim deste século com mais de cem dias com temperaturas acima
de 20 graus a cada ano.
O
relatório do IPCC afirma também que a ocorrência continuada do fenômeno
climático conhecido como El Niño (aumento da temperatura da água na superfície
do Oceano Pacífico) poderá provocar secas com meses de duração nas regiões
Norte e Nordeste do Brasil. Por outro lado, o fenômeno inverso, conhecido como
La Niña, poderá agravar as tempestades e inundações nas regiões Sul e Sudeste
do país.
Como
consequências imediatas do aquecimento, o relatório aponta a diminuição da
produção agrícola, a acentuada perda da biodiversidade no Cerrado, a
savanização do Leste da Amazônia, o aumento das precipitações no Oeste da
Amazônia e o “fim do inverno”, com aumento médio de até quatro graus naquela
estação e temperaturas elevadas o ano todo. O colapso no regime de chuvas, por
sua vez, provocaria crise nas usinas hidrelétricas brasileiras e no fornecimento
da energia por elas gerada.
Cidades
Suzana
Khan ressalta ainda a importância dada pelo relatório do IPCC à organização do
enfrentamento às mudanças climáticas nas principais metrópoles do planeta: “As
cidades são grandes fontes de emissão de gases de efeito estufa. Se o setor
energético é um dos que mais contribuem para o aumento da temperatura, quem
demanda essa energia são as próprias cidades, seja para iluminação, mobilidade
e transporte ou uso residencial. Então, a forma com que estão crescendo faz das
cidades grandes demandadoras de recursos naturais. Isso as torna a principal
fonte de emissão de gases de efeito estufa”, diz.
A
vice-presidente do IPCC afirma que, por outro lado, estão também nas cidades os
principais danos provocados pelas mudanças climáticas: “Há o dano onde há
população. A população que mora nas cidades será muito afetada por conta desses
efeitos e impactos trazidos pelas mudanças climáticas. É preciso ter um olhar
cuidadoso em relação às cidades. Os governantes municipais têm que ser chamados
para atuar junto ao governo federal nos planos nacionais porque quem acaba
tendo que agir na ponta, realmente, são as cidades. Por isso, elas não podem
ficar à parte das discussões climáticas”, diz.
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