Como
viver, que sintomas, que doenças estão nos marcando hoje? Que mudanças e aprendizagens
são mais importantes? São perguntas do livro “A Sociedade do Cansaço” de Byung-Chul
Han.
Byung-Chul
Han é sul-coreano. Depois de estudar Metalurgia no seu país natal, rumou à
Alemanha, onde se doutorou em Filosofia, sendo atualmente professor na
Universidade de Artes de Berlim. É sobre a sua obra “A Sociedade do Cansaço”
que vamos falar um pouco.
“Consideremos,
em primeiro lugar, a sociedade do cansaço. Efetivamente, a aceleração do
processo histórico e a multiplicação de sons, de mensagens, o exagero de
estímulos e comunicações, especialmente pelo marketing comercial, pelos
celulares com todos os seus aplicativos, a superinformação que nos chega pelas mídias
sociais, nos produzem, dizem estes autores, doenças neuronais: causam
depressão, dificuldade de atenção e uma síndrome de hiperatividade. Efetivamente,
chegamos ao fim do dia estressados e desvitalizados. Nem dormimos direito,
desmaiamos.” (Leonardo Boff).
A
sociedade ocidental do século XXI é uma sociedade marcada pelas doenças
neuronais – depressão, stress, hiperatividade, déficit de atenção (repare-se
nas crianças!). Estas doenças ocupam hoje o lugar antes ocupado por doenças
bacterianas e virais, como a tuberculose e a gripe. Mas as doenças bacterianas
e virais consistem essencialmente em elementos externos (bactérias, vírus) que afetam
o nosso corpo, e aos quais podemos levantar defesas; já as doenças neuronais, por outro lado, vêm de dentro de nós, tornando-se
a sua cura mais difícil.
É
o estilo de vida ocidental que está provocando esta onda crescente de doenças,
com efeitos devastadores nas relações, nas famílias, na vida pessoal. Trata-se “da
violência da positividade, que resulta da superprodução, do superrendimento e
da supercomunicação”. O contexto laboral que marcou grande parte do século XX –
industrial disciplinado – está mudando: hoje, as palavras-chave são motivação,
iniciativa, rendimento. Muda o âmbito da violência: já não uma violência vinda
de fora – as ordens dadas por um patrão, as sirenes das fábricas – mas uma
violência que se exerce na pessoa a partir de dentro – na necessidade de ser
produtiva, audaz, empreendedora. Mas, e quando a pessoa não consegue atingir os
“objetivos” a que se propõe e a que é proposta?
É
a sociedade do «yes, we can», do «like». Como lidamos com o fracasso,
experiência fundamental numa vida humana em construção, mas uma experiência que
não tem lugar na sociedade moderna? Hoje, o trabalhador modelo é o trabalhador
capaz do multitasking – ser capaz de realizar, na perfeição, múltiplas tarefas,
ao mesmo tempo. Mas as grandes criações humanas – na ciência, na cultura, na
arte – só foram possíveis através de longos períodos de atenção, silêncio e
concentração. Do mesmo modo, as nossas relações familiares sofrem quando somos
incapazes de lhes conceder a nossa total atenção – algo difícil no meio de
todas as distrações e solicitações que nos atingem. O excesso que caracteriza a
sociedade ocidental – excesso de informação, de comunicação, de emoções, de objetivos
– provocam uma dispersão na pessoa, uma incapacidade de estar centrada, um
desgaste mental e físico insuportável.
Como
lidar com esta realidade? Como aprender a gerir e a controlar os infinitos
estímulos que nos afetam, desde a comunicação à internet, passando pelas
imagens e pela violência dos telejornais? Como ser capaz de “desligar”? Urge
(re) aprendermos a arte da atenção, da escuta, do silêncio, do deter-se, do dar
espaço, do não cair nas “engrenagens” de consumo e produção, para que o ser
humano não se converta “numa máquina de rendimento, cujo objetivo consiste no
funcionamento sem alterações e no máximo de rendimento”.
Trata-se de crescer na pedagogia do
olhar: “Aprender a
ver, que significa acostumar o olho a observar com calma e com paciência, a
deixar que as coisas se aproximem dos nossos olhos, quer dizer, educar o olho
para uma profunda e contemplativa atenção, para um olhar amplo e pausado. Este
aprender a olhar constitui o primeiro ensinamento preliminar para a
espiritualidade”. Curiosamente, o autor termina a sua obra propondo um
outro tipo de Cansaço – o cansaço do Sábado bíblico, do descanso como um criar
espaço, um dia em que – segundo o texto bíblico – Deus já não cria e, por isso,
a Criação pode chegar à sua Plenitude. Trata-se, para o autor, de permitir que
o Espírito inspire.
Byung-Chul Han, “A
Sociedade do Cansaço”, Lisboa 2014. Mensageiro de Santo António
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